Palavra em Terapia

Um espaço para textos, pensamentos, fotos, reflexões...































segunda-feira, 2 de agosto de 2010

Salve Rainha do Mar!

A Bahia é palco de diversas manifestações culturais e religiosas. Abrigando em seu seio diversas raças e miscigenações, é também um estado repleto de religiões e crenças, que enriquecem sua cultura com rituais, festejos e manifestações. O dia 02 de Fevereiro é um dia de festa, festa na Bahia, Dia de Iemanjá!

Mas quem é Iemanjá? Mito, entidade, Orixá, é o arquétipo correspondente ä Grande Mãe, a Deusa Mãe, Rainha das Águas, Mãe dos Orixás, protetora dos marinheiros e pescadores, deusa, rainha soberana, das águas e das mudanças. Arquétipo correspondente ä maternidade e fertilidade, simboliza compaixão, amor incondicional e plenitude. Tem como características força e determinação e o sentimento gratuito de amizade. “Ouve” seus filhos, levando para o fundo do mar seus problemas e angústias e enviando-lhes, através das ondas, soluções para seus problemas, sendo bastante generosa.

Sendo uma Deusa Lunar, tem como principal característica a mudança, mostrando-nos que tudo na vida é cíclico, permitindo a renovação, e está ligada aos movimentos que representam expansão e desenvolvimento.
No sincretismo religioso corresponde a Nossa Senhora e Virgem Maria, tendo a supremacia hierárquica da Grande Mãe e da maternidade.
O baiano é um povo com uma cultura riquíssima, que traz em sua história uma bagagem imensa de simbolismos e representações, muitas dessas dadas pelas religiões. Um povo miscigenado, misturado, marcado por grandes contrastes e contradições: alegre e triste, liberal e preconceituoso, solidário e opressor, inclusivo e excludente, sagrado e profano. Assim como nossa vida psíquica, cheia de antagonismos, de opostos, cuja união leva a totalidade, a individuação.
E por isso adoro as religiões. Todas elas trazem em seu bojo um conjunto de símbolos, ritos e mitos que permitem a agregação entre esses opostos complementares de nossa psique. As experiências religiosas têm a função de recuperar a energia psíquica advinda dessa tensão de opostos, através de seus símbolos, e nos conectar com a força maior que rege o universo.
Força essa que os homens buscam negar, por sua necessidade de controle sobre tudo. Assim, buscam cientifizar e intelectualizar as coisas, negando tudo que não pertence ao científico, que é do místico, do sagrado, e por isso está fora de seu alcance e controle. Doce ilusão, com tanta inteligência não terem ainda percebido que querendo ou não existe algo maior, transcendente, que rege todas as coisas e sobre o qual não tem controle. Só muita prepotência e pouca humildade para não perceber que aquilo que controla, descontrola.
Da forma com que vem conduzindo suas buscas e sua necessidade constante por explicar tudo, o papel das religiões vem mudando. Os sacerdotes, religiosos, sábios, curandeiros, vem perdendo espaço dentro da sociedade e da vida dos homens, mas não sua importância, pois essa busca, não nos fez perder nosso lado numinoso, e é a religião que permite esse encontro com esse lado, através dos seus símbolos, cumprindo assim seu papel de re-ligare, de permitir a re-ligação do homem com esse algo maior e transcendente que rege o universo.
A busca por controle evidencia a grande insegurança existente dentro de cada um. Quando o homem se conscientizar que só através da entrega a essa força maior, seja ela Deus ou como queriam chamar, encontrará suas respostas, a segurança e soluções que ele procura é que será mais feliz. Enquanto isso seguirá buscando tão longe, fora de si, algo ou alguém que lhe indique os caminhos.
As religiões podem auxiliar no processo de individuação do homem, processo ao qual todos estamos submetidos. Através da introjeção de seus símbolos, que ajudam a descortinar o véu do inconsciente e integrá-lo ä consciência, promovendo a amplificação dessa. Através dos símbolos do inconsciente percorremos o caminho para nosso self e entramos em contato com nosso numinoso, com o sagrado.
Qual a melhor religião para percorrer esse caminho? Como disse o Dalai Lama a Leonardo Boff certa vez, a religião certa é aquela que permite ao homem o contato com o melhor que tem em si, auxiliando-o a transformar-se no melhor que pode ser.
Hoje, dia de Iemanjá, fico a observar e percebo que apesar de toda força para tudo intelectualizar, cientifizar, o homem continua fazendo suas buscas pelo sagrado, pelo inexplicável, que o é aparentemente aos nossos olhos, mas não aos nossos espíritos. O homem continua a fazer suas buscas pelas respostas, e o inconsciente coletivo com suas construções continua falando mais alto visto que os arquétipos, os mitos, não perdem força dentro de nós, continuam sendo quem nos conduzem diante das nossas buscas por respostas e felicidade.
Nos momentos de aflição e quando a ciência não fornece as respostas para as dúvidas e soluções para os problemas, é a essa força maior, seja chamada de Deus ou como for que o homem recorre, e se entrega na espera de respostas. E é justamente nessas horas, quando não sabemos mais o que fazer e nos entregamos, que as respostas vem. O sentimento de confiança permite a entrega, visto que confiar é fiar com, e só através dessa entrega é que conheceremos verdadeiros valores que nos guiem por caminhos seguros e preencham o vazio tão sentido em tantos momentos. Como disse Rosane Volpato, “entrega é confiança, mas tente pelo menos uma vez entregar-se, pois lhe asseguro que a confiança virá e será tão cega e profunda quando a sua desconfiança de agora. O seu desconhecimento destes valores, escondem a presença de quem pode lhe ajudar e provocam sentimentos de ausência e distância. Não somos deuses, mas não devemos nos permitir viver à sombra deles.” Eu diria mesmo que não somos deuses, mas contemos seus elementos dentro de nós, e isso nos permite alcançar um discernimento e uma sabedoria muito maior do que a que possuímos.
É da amplificação da consciência e da entrega aos símbolos místicos contidos em nosso inconsciente coletivo e que nos surgem muitas vezes através dos símbolos religiosos que alcançaremos nosso estado de plenitude e totalidade. Os rituais religiosos permitem o encontro, a busca por esses símbolos tão presentes e fortes dentro de nós.
Importante pensarmos nossa fé e nossas crenças, que olhemos o mundo sob perspectivas mais humanas e menos pretensiosas, reconhecendo a existência de uma energia maior que nos governa, pois assim poderemos alcançar posições de menos fanatismos e mais coerências. Raciocinar nossa fé pode ser um bom caminho para o encontro das soluções das aflições que permeiam nossas mentes. Fé essa que pode ser dirigida a um Deus, uma Deusa, uma divindade, uma força maior, a nós mesmos, afinal, cada deus e Deus estão presentes dentro de nós. O importante é acreditar, e se entregar. Para tanto, confiar!
Então no dia de hoje, e em cada dia, Salve Iemanjá, olhai por nós Nossa Senhora, não nos abandone, DEUS, que sua força e sabedoria possam emergir das profundezas de nosso ser, auxiliando-nos a percorrer um caminho melhor e mais feliz! Que as religiões voltem a ter a função sagrada por excelência a conduzir seus fiéis por caminhos mais felizes, no encontro consigo mesmo e com o divino e numinoso, e deixem de ser mecanismos coercitivos e de obtenção de poder e dominação sobre o outro.
Texto de 02 de Fevereiro de 2010

Nenhum comentário:

Postar um comentário